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Li três livros, todos escritos por mulheres e de não-ficção:
Ensaios sobre Fotografia, de Susan Sontag (3 estrelas)
A Miúda da Banda, Kim Gordon (4 estrelas)
Em nome da filha, Carla Maia de Almeida (4 estrelas)
Fevereiro foi um mês fraco em termos de número de livros lidos (em relação aos meus padrões habituais), mas que acabou por ser compensatório face à qualidade dos mesmos. Foi um mês de mudanças: de trabalho, de rotinas e de disponibilidade, mas, apesar da tristeza, não fiquei completamente desiludida porque sei que com esforço consigo voltar à normalidade e porque grande parte dos meus tempos livres foram dedicados a ver os filmes nomeados para os Óscares, num total de 16 (o meu melhor mês cinematográfico de sempre), aos quais se soma o magnífico Mustang.
Li apenas mulheres como tinha estipulado para este mês e, dado o caos em que se tornou a minha vida durante este pequeno mês, mas longo em novidades e adaptações, foi impossível dedicar tempo a Proust. Não pretendo desistir, mas sei que após uma pausa tão grande vai ser difícil recomeçar no ponto onde o deixei, pelo que pondero seriamente recomeçar a sua leitura - sem dramas.
Título: A Miúda da Banda
Autor: Kim Gordon
Editora: Bertrand
Há muito tempo que desejava ler A Miúda da Banda pelos mais variados motivos, dos quais se destacam o meu gosto por Sonic Youth e o facto de tratar-se de um livro de não-ficção escrito por uma mulher, Kim Gordon, na condição de pioneira entre as mulheres do rock, mas que é muito mais do que isso.
No meu íntimo já suspeitava que ia gostar bastante deste livro, mas depois de começar a lê-lo tive a certeza. Adorei a estrutura e organização do livro, a forma intimista, aberta e transparente com que Kim aborda os mais variados assuntos, alguns sensíveis, outros nem tanto, mas nenhum desnecessário, e as fotos, maravilhosas.
Estava a ler, na altura, um livro chamado "Mother Daughter Revolution", sobre a primeira onda de feminismo dos anos setenta. O livro foca-se no facto de o feminismo não conseguir tratar a relação entre mães e filhas por causa da ênfase na fuga do lar. Não o terminei - quem é que consegue ter tempo ou energia quando acabou de se tornar mãe? - mas lembro-me de o livro falar da pressão de se ser perfeito e agradável para toda a gente que se abate sobre as mulheres, pressão essa que acaba por ser projectada nas suas filhas. Nunca são suficientemente boas. Nenhuma mulher consegue ultrapassar aquilo que tem de fazer. Não é possível ser-se tudo: uma mãe, uma boa parceira, uma amante e, simultaneamente, uma participante local de trabalho. "Little Trouble Girl" é sobre o querer ser-se visto pela pessoa que se é realmente, sobre ser-se capaz de expressar essas partes de nós mesmas as que não são de "boa menina", mas que são, também, reais e verdadeiras.
Pontuação: 4
Título: Em nome da filha
Autor: Carla Maia de Almeida
Editora: Fundação Manuel dos Santos
Pouco tempo depois de ter visto a referência da Cláudia a este livro, encontrei-o quando estava na caixa do Pingo Doce e decidi trazê-lo comigo para casa, afinal, era tão barato, escrito por uma mulher e com um tema tão relevante que se tornou impossível resistir.
Em nome da filha trata-se de uma reportagem com pouco mais do que cem páginas que inclui o testemunho de várias mulheres vítimas de violência doméstica, sob as mais variadas formas e feitios. Entre relatos, opiniões de profissionais e factos numéricos, é-nos mostrada a realidade em que consiste este desastre humano, que parece estar cada vez mais presente nos dias de hoje e que, apesar das medidas que vão sendo tomadas e das acções de sensibilização cada vez mais frequentes, ainda é muito longo o tempo médio em que a vítima é subjugada ao comportamento do abusador. Apesar deste livro incluir apenas testemunhos de vítimas femininas, este não é um livro contra os homens, foi simplesmente o prisma que esta jornalista decidiu escolher para escrever sobre este assunto. Recomendo vivamente.
Pontuação: 4
Melhor Filme:
Deve ganhar: La La Land / Gostava que ganhasse: La La Land, Moonlight ou Hacksaw Ridge (partindo do princípio que Hidden Figures não será capaz de ganhar)
Melhor Realizador:
Deve ganhar: Damien Chazelle (La La Land) / Gostava que ganhasse: Mel Gibson (Hacksaw Ridge) ou Barry Jenkings (Moonlight)
Melhor Actor Principal:
Deve ganhar: Ryan Gosling (La La Land) / Gostava que ganhasse: Casey Afflect (Manchester by the Sea) ou Andrew Garfield (Hacksaw Ridge)
Melhor Actriz Principal:
Deve ganhar: Emma Stone (La La Land) / Gostava que ganhasse: Natalie Portman (Jackie)
Melhor Filme Estrangeiro:
Deve ganhar: Toni Erdmann / Gostava que ganhasse: A Man Called Ove, Land of Mine ou Toni Erdmann (por ordem de preferência)
Opiniões Detalhadas: Arrival | Fences | Hacksaw Ridge | Hell or Hight Water | Hidden Figures | La La Land | Manchester by the Sea | Moonlight | Captain Fantastic | Elle | Loving | Jackie | Florence Foster Jenkings | Land Of Mine | A Man called Ove | The Salesman | Tanna | Toni Erdmann
O último filme da minha lista de nomeados para ver antes da cerimónia dos Óscares que se realiza esta noite (os nomeados para as categorias de Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Actor Principal, Melhor Actriz Principal e Melhor Filme Estrangeiro, num total de 17 filmes, embora haja alguns que ainda devo ver depois) foi A Man Called Ove e não poderia ter feito uma escolha mais acertada, fechei esta maratona de filmes com chave de ouro.
Ove é um homem muito especial, que nos faz rir com as particularidades que o caracterizam, mas que também nos deixa de coração apertado, cheios de vontade de o abraçar. É um homem teimoso e obstinado, mas com um grande coração, metaforica e literalmente falando, como irão descobrir se assistirem a este maravilhoso filme sueco. Para além do retrato que vamos construindo de Ove desde a sua infância até à velhice, à medida que A Man Called Ove se vai desenrolando, deparamo-nos com uma história de amor muito bonita.
Novamente, é nos filmes simples, que retratam pessoas que se diferenciam dos demais, mas com os quais nos identificamos tanto, que encontro o maior conforto, que me rio com um sorriso de despreocupada felicidade e que me emociono perdidamente.
Pontuação: 10/10
Hidden Figures reúne três temas que me são bastante queridos: ciência, o papel das mulheres na sociedade em geral e na ciência em particular, e a conquista do espaço. Apesar de já ter ouvido algumas críticas menos positivas, acho que este filme é bastante completo e que a figura de Katherine Goble não ofusca Dorothy Vaughan nem Mary Jackson, pelo contrário, estas completam-se e complementam-se.
Para além do típico problema de não ser dado o devido crédito aos feitos de mulheres, sobretudo naquela época (1961), estas três senhoras enfrentavam ainda outro preconceito: o da cor da sua pele. Apesar de saber que é da maior importância que não nos esqueçamos da forma como eram postos de parte nas mais variadas situações, sendo-lhes atribuídos lugares separados, e do nojo com que eram tratados, assistir ao retrato desta discriminação em filmes é algo que tem um efeito muito negativo em mim, por isso, foi com particular emoção que assisti a duas cenas bastante marcantes no filme (que prefiro não desvendar).
Pode não ser o filme mais espectacular de sempre, nem conceptual como os críticos tanto gostam, mas é um filme que retrata perfeitamente a história destas mulheres, que existiram na vida real, e que tanta importância tiveram para a ciência, para a NASA, para as mulheres e para a humanidade. Merece muito ser visto por todos.
Pontuação: 9/10
Após ter assistido a The Salesman percebi que não sou grande fã dos filmes de Asghar Farhadi, até gostava, mas não consigo. Tive o mesmo problema que com A Separation, que vi há relativamente pouco tempo.
Acho que os seus filmes ficam minutos e minutos suspensos em torno da mesma coisa, não havendo um grande desenrolar da acção. Acredito que tal seja propositado, que o seu trabalho tenha uma excelente qualidade e que os problemas abordados nos seus filmes sejam da mais elevada importância, mas comigo pura e simplesmente não resultam.
Pontuação: 6/10
Elle é um thriller muito bom que começa com Michèle sendo violada e que se desenrola à medida que esta tenta descobrir o responsável por este acto. À medida que lidamos com o trauma de Michèle e o seu constante receio de que se repita a violação, somos colocados no meio de uma estrutura familiar, de amigos e do seu próprio trabalho, cheia de perturbações, mentiras, ciúmes e traições.
Apesar da qualidade deste filme, tenho algumas dúvidas se Isabelle Huppert merece estar nomeada para o óscar de melhor actriz principal. O seu desempenho é bastante bom, mas não o considero soberbo ao ponto da nomeação. Se procuram um filme que vos deixe constantemente em sobressalto e desconfortáveis (há bastante tempo que não encontrava isto num filme e acabou por ser uma boa experiência) não deixem de ver Elle.
Pontuação: 7/10
Florence Foster Jenkings é um filme que se lhe retirássemos a participação de Meryl Streep seria um profundo fracasso, no meu entender. Meryl dá a profundidade e a comédia necessárias que este género de filme necessita para que não desistamos dele, tornando esta história verdadeira, a história de uma das piores cantoras de sempre, num filme engraçado de assistir.
Só Meryl Streep poderia fazer algo de um filme que, apesar de poder ser considerado inspirador, não é muito forte. É simplesmente a história de uma mulher que canta mal, muito mal, mas que vive na profunda ilusão de que canta bem e que todos adoram a sua voz, ilusão alimentada pelo marido que vai segurando as pontas de toda a loucura que gira em torno de Florence. Ainda pensei que no final surgisse algum rasgo de lucidez autónomo e não responsável por outros, mas não.
Pontuação: 6/10
Toni Erdmann é um filme fantástico sobre a conexão perdida entre pai e filha e o que implica voltar a reavivá-la. Este pai vai seguir um caminho completamente cómico e surreal, que à primeira vista pode parecer pouco credível, mas que qualquer um de nós ficaria desejoso que pudesse acontecer connosco se estivessemos na mesma situação.
Primeiro, tomando o lugar da filha, deixa-nos perplexos e desconfiados com o ridículo da situação e com os impactos que as acções deste pai têm na carreira da filha, mas depois faz-nos rir ao mesmo tempo que nos emociona quando percebemos que as barreiras se estão a quebrar e que tudo volta a equilibrar-se e que este é um caminho tão ou mais válido que qualquer outro. Faz-nos desejar que alguém se sujeitasse a tudo isto para reatar uma relação connosco.
Este é um daqueles filmes que mais vale não saber grande coisa sobre ele e deixarmo-nos guiar por aquilo que ele nos dá. Vejam-no.
Pontuação: 9/10